A afirmação que se faz no título
desse artigo fundamenta-se em cinco percepções acerca da presença da
Igreja Evangélica na nação brasileira, relativamente a sua atuação.
Em primeiro lugar, a Igreja Evangélica Brasileira é
legitimadora da corrupção porque não a denuncia. Não concebe que deva
encarnar a função profética, relega ao segundo plano as questões
sócio-políticas, e não se manifesta sobre aquela que é a maior
manifestação do mal nas terras brasileiras: a corrupção. Não há
denúncia.
Em segundo lugar, a Igreja Evangélica Brasileira é
legitimadora da corrupção porque sua ação social substitui a ação do
Estado, não denuncia a situação e não exige que o Poder Público
desempenhe suas obrigações. Se por um breve momento a Igreja Evangélica
Brasileira deixasse de realizar suas ações de assistência social, o País
se tornaria um caos, imediatamente. A distribuição da renda,
consubstanciada na distribuição de cestas básicas e demais ações
similares, a recuperação e inserção social, consubstanciadas nos
trabalhos das inúmeras casas de recuperação, a promoção do ensino, por
intermédio de milhares de escolas confessionais, o cuidado com a
criança, realizado por creches e pela própria Escola Dominical, tudo
isso, são funções do Estado negligente que não as realiza. Na medida em
que a Igreja Evangélica faz tudo isso – e jamais deve deixar de fazer –
sem a devida e obrigatória participação do Estado, e não denuncia a
gravidade do fato, está sendo cúmplice de governantes e parlamentares
criminosos, que utilizam em benefício próprio os recursos que deveriam
ser destinados a essas atividades.
Em terceiro lugar, a Igreja Evangélica Brasileira é
legitimadora da corrupção porque se associa ao Poder Público sem a
crítica adequada. Seus líderes sobem nos palanques políticos, impõem as
mãos sobre as cabeças de gente cujo pensamento está voltado apenas para
seus próprios interesses e para o crime, dá e recebe condecorações de e
para gente sem a menor credencial ética para isso, cede os púlpitos a
bandidos, enfim, associa-se a gente que deveria estar presa, mas que
usufrui da liberdade que o seu poder lhes permite adquirir. Aqueles que
deveriam ser alvo de denúncia e profetismo por parte da Igreja são seus
grandes amigos e aliados.
Em quarto lugar, a Igreja Evangélica Brasileira é
legitimadora da corrupção porque não desenvolve ações consistentes de
combate à corrupção. E nem poderia ser diferente, visto que ela nem
mesmo a denuncia. Enfrentar esse mal é obrigação, mas nada faz a
respeito.
Em quinto lugar, a Igreja Evangélica Brasileira é legitimadora da corrupção porque a pratica desavergonhadamente.
À denúncia acima pronunciada segue-se, necessariamente, a proposta de ação.
1. Para denunciar a corrupção nos púlpitos, e perante
a nação, obrigação inadiável da Igreja Evangélica Brasileira, é
necessário colocar ordem dentro de casa: transparência das contas.
Igrejas precisam publicar seus balancetes e prestar contas do que fazem
com os dinheiros de seus membros, se quiserem ter credibilidade e
autoridade para profetizar contra o mau uso dos recursos pelo Poder
Público. Os líderes de igreja não podem submeter-se apenas à prestação
de contas – inevitável e certa – diante de Deus. Precisam entender o
momento em que o País se encontra e dar o exemplo. Transparência, eis a
exigência.
2. A Igreja não pode deixar de fazer ação social, mas
tem que cobrar a ação do Governo, o emprego das verbas públicas nos
programas sociais e as ações que promovam a distribuição de renda.
Precisa-se, antes de mais nada, de informações acerca de todo o esforço
que a Igreja Evangélica Brasileira está fazendo para amenizar a situação
de dificuldade em que vive grande parte da nação. O Governo tem que
conhecer a enorme dimensão dessas ações, e seu alcance. Trabalho que dá
credibilidade para cobrar do Governo que faça a sua parte, em particular
impedindo que o dinheiro público seja desviado para atender a
interesses privados. A Igreja não pode substituir a ação do Estado, como
ocorre hoje; esse esforço tem que ser complementar. O Estado tem a
obrigação de zelar por seus cidadãos, a Igreja, de amar o próximo. O
trabalho da Igreja não exime o Estado de sua responsabilidade. No
entanto, a última coisa que se deve pleitear é a parceria na qual as
igrejas recebam mais verbas públicas para a realização de ações de cunho
social. Há generosidade e recursos suficientes para contribuir com as
obras das Igrejas. Não se rejeitam parcerias com o Poder Público, mas
elas só podem se estabelecer fundamentadas em sólidos sistemas de
controle e transparência. Em parceria com o Poder Público, a Igreja tem
demonstrado que é engolida pelo mesmo mal que assola a Nação.
3. Não há outra possibilidade, nesse momento, senão o
rompimento radical com as práticas que a Igreja Evangélica Brasileira
tem adotado em relação aos seus representantes no Poder Executivo e no
Poder Legislativo. Se eles querem ir às igrejas, ou se mesmo já são
membros, que se assentem nos bancos e ouçam, em silêncio. Se quiserem
conversar com esse povo sobre política, que se marquem reuniões
específicas para isso, e que nunca se tratem tais assuntos em cultos.
Não se pode mais chamá-los aos púlpitos e impor sobre eles as mãos,
manipulando a compreensão dos membros. Se querem oração que recebam-na
nos gabinetes, pois o Deus que ouve em secreto em secreto os responderá.
Pastores não devem receber condecorações das mãos de criminosos
travestidos de prefeitos e parlamentares, há que se ter o mínimo de
decência e discernimento.
4. A Igreja precisa adentrar o espaço público aberto a
ela e a toda a comunidade. Participar dos Conselhos Municipais de
Políticas Públicas criados por lei para exercer o controle das ações
públicas em áreas como a educação, a saúde e a assistência social, entre
outras. Pastores devem incentivar seus membros a participar, promover
treinamento para eles, e facilitar-lhes o acesso a estas instâncias de
participação política. Fazendo isso, a Igreja estará garantindo a
merenda escolar para seus próprios filhos – e demais crianças de suas
cidades, o salário adequado para os professores, os recursos para as
entidades de assistência social, os programas de enfrentamento de
moléstias, o dinheiro para a farmácia básica, entre tantas outras
possibilidades. A legislação brasileira tem criado esses conselhos, dos
quais devem fazer parte representantes da sociedade civil organizada.
Espaço absolutamente adequado para a ação consistente da entidade que
mais faz ação social nesse País, a Igreja Evangélica Brasileira.
5. Quanto à participação na corrupção desenfreada
nesse País, já conhecida há tanto tempo, e vergonhosamente evidenciada,
por exemplo, na CPMI dos Sanguessugas, é necessário, em arrependimento e
quebrantamento, pedir perdão. Pedir perdão a Deus e à Nação, pois
esperava-se muito mais da Igreja Evangélica Brasileira.
Sobre ela pesa duro juízo, por suas ações, por sua
acomodação, por sua omissão cúmplice. Pois, ao invés de destruir as
obras do diabo, tornou-se particípe delas.
* Henrique Moraes Ziller é membro da Igreja
Metodista da Asa Sul, em Brasília – DF, é Auditor Federal de Controle
Externo do Tribunal de Contas da União e Presidente do Instituto de
Fiscalização e Controle.
Fonte: Cristianismo hoje
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